Efeitos da Pandemia nos Contratos de Locação

Desde o reconhecimento pelo Congresso Nacional do estado de calamidade pública no Brasil em decorrência da pandemia do coronavírus (Covid-19), enfrenta-se restrições no funcionamento de serviços em todos os municípios do País, situação que interfere nas mais diversas relações jurídicas de direito privado.

 

Uma das relações que mais sofreram e ainda sofrem com os efeitos da pandemia é a relação locatícia. Diversos locatários viram seus rendimentos zerarem em razão do fechamento obrigatório de serviços não essenciais, e, atualmente, ainda que autorizado o funcionamento de seus negócios – com diversas restrições –, ainda não conseguiram retornar aos patamares anteriores.

 

Como consequência da diminuição de seus rendimentos, os locatários passaram a solicitar descontos nos aluguéis. No início de abril/2020, havia levantamento dando conta que os pedidos de acordo de aluguel junto às imobiliárias de São Paulo cresceram 40% (quarenta por cento) [1].

 

A Lei Federal nº 14.010 de 10 de junho de 2020 dispõe sobre “o Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado (RJET) no período da pandemia do coronavírus (Covid-19)” e trata dos problemas decorrentes da inadimplência crescente nos contratos locatícios.

 

Nos termos do artigo 9º – cujo veto presidencial foi rejeitado pelo Congresso Nacional -, “Não se concederá liminar para desocupação de imóvel urbano nas ações de despejo, a que se refere o art. 59, § 1º, incisos I, II, V, VII, VIII e IX, da Lei nº 8.245, de 18 de outubro de 1991, até 30 de outubro de 2020”. O artigo em comento impede o despejo liminar do locatário nas hipóteses elencadas, o que não significa dizer, contudo, que a ele é dado o direito de permanecer no imóvel sem o pagamento do aluguel. Ao final da ação poderá ser decretado o despejo por sentença, momento a partir do qual poderá o locador, em regra, perseguir o cumprimento provisório da ordem judicial.

 

Outrossim, diversos locatários, preocupados em não perder o imóvel locado, propuseram ação judicial para redução do valor locatício durante a pandemia, com fundamento na teoria da imprevisão, consagrada no artigo 317 do Código Civil. O Poder Judiciário, sem perder de vista a autonomia das partes, a intervenção mínima e a excepcionalidade da revisão contratual (arts. 420 e 421-A do CC), vêm concedendo tutelas antecipadas para redução dos aluguéis em 20, 30 e até 50% (cinquenta por cento), sempre sopesando os efeitos da pandemia ao caso concreto.

 

De fato, é importantíssima a intervenção estatal nas relações de direito privado na atual fase vivida pela sociedade – pelo Poder Legislativo, Executivo ou Judiciário –, com vistas a garantir a continuidade de diversas atividades em período conturbado, devendo ser autorizada a revisão contratual nos casos comprovados de efetiva necessidade, o que, apesar do retorno gradual e progressivo das atividades econômicas, ainda se mostra possível em diversos segmentos.

 

 

[1] Disponível em https://www.cnnbrasil.com.br/business/2020/04/14/renegociacao-e-parcelamento-do-aluguel-se-tornam-saidas-na-crise-do-coronavirus. Acesso em 5.10.2020