NO ENTENDIMENTO DO STJ, EM REGRA, NÃO CABEM HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS EM INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA.

Em recentíssimo julgado, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça reafirmou o posicionamento da Corte Superior no sentido de que não é devida condenação ao pagamento dos ônus sucumbenciais em incidente de desconsideração da personalidade jurídica, em decorrência da “ausência de previsão legal excepcional”.

 

No julgamento do Recurso Especial nº 1.845.536/SC, a Terceira Turma, por maioria de votos, deu provimento ao recurso especial para reformar o acórdão recorrido que havia condenado a autora a suportar os ônus sucumbenciais oriundos da improcedência do pedido de desconsideração da personalidade jurídica, consignando que o IDPJ é resolvido por decisão interlocutória – nos termos do disposto no artigo 136 do CPC –, não comportando, por isso, fixação de verba sucumbencial, ante a expressa previsão do artigo 85 do CPC que somente a sentença e as hipóteses taxativas do §1º condenarão o vencido em sucumbência.

 

Por essa razão, o Min. Marco Aurélio Bellize em seu voto vencedor, consignou ser “dispensável a perquirição da causalidade e da sucumbência, porquanto a decisão de extinção de incidente não está presente no rol do art. 85, caput e §1º, do CPC/2015”.

 

Em outras palavras, a Corte Especial partiu de interpretação totalmente restritiva do artigo 85 do CPC para estabelecer que nas decisões judiciais que não possam ser conceituadas como sentenças, não haverá, em regra, a condenação em honorários sucumbenciais, observada as hipóteses taxativas do §1º do art. 85.

 

Melhor fundamento para o provimento do Recurso Especial citado foi dado pela Min. Nancy Andrighi, em seu voto vencido. Para ela, embora tenha concluído que quem deu causa ao IDPJ foram os sócios que tiveram contra si instaurados o incidente – com o que, com a máxima vênia, não se concorda –, é certo que a decisão que resolve o IDPJ resolve o mérito da lide colocada com relação aos sócios, havendo que se entender que o caput do art. 85 do CPC faz alusão às sentenças propriamente ditas e às decisões interlocutórias que apreciem o mérito, além de outras em que poderá haver sucumbência, excluindo-se da fixação de honorários nas resoluções dos incidentes processuais somente “se a decisão do incidente se enquadrar como uma pura, genuína ou típica interlocutória, em que não ocorre o julgamento de mérito de algum capítulo do pedido ou a extinção do processo em relação a determinado litigante”.

 

Trata-se, realmente, da melhor interpretação à situação enfrentada. O pedido de desconsideração de personalidade jurídica não constitui mero incidente processual, mas verdadeiro processo incidental, pelo qual se objetiva a inclusão dos sócios – ou da pessoa jurídica, no caso da desconsideração inversa – para que pague a dívida da pessoa jurídica, passando a ser contra eles conduzido o processo judicial.

 

Como bem leciona Rogério Licastro Torres de Mello:

 

Não faz sentido, em nosso pensar, recursar-se a natureza jurídica de ação ao pedido de desconsideração incidental da personalidade jurídica: há, de fato, a presença dos elementos da ação, quais sejam, (i) as partes, (ii) a causa de pedir (alguma das circunstâncias do art. 50 do CC) e (iii) o pedido em face do sócio que figurará como requerido. [1]

 

Na mesma linha defende Cassio Scarpinella, ressalvando, contudo, que se trata de questão delicada e complexa:

 

É que, a despeito de a desconsideração desenvolver-se e resolver-se incidentalmente, a decisão a ser proferida nele é equiparada a uma sentença que cria uma nova realidade jurídica, relativa à desconsideração. Na mesma proporção em que o CPC de 2015 enaltece o contraditório que prepara o proferimento daquela decisão com a prévia (e inafastável) citação nos moldes do art. 135, mostra-se coerente entender que a decisão também imporá ao sucumbente a responsabilidade pelas despesas e pelos honorários. Ainda que se trate de decisão interlocutória que resolve questão incidente ao longo do processo. [2]

 

Assim, não remanesce dúvidas de que o posicionamento que vem sendo firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, infelizmente, não coaduna com o entendimento da melhor doutrina, não sendo razoável afastar a condenação em honorários sucumbenciais no incidente de desconsideração da personalidade jurídica partindo de interpretação restritiva e reducionista do disposto no artigo 85 do CPC.

 

[1] MELLO, Rogério Licastro Torres de. Honorários advocatícios: sucumbenciais e por arbitramento. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019. p. 90.

 

[2] BUENO, Cassio Scarpinella. Comentários ao código de processo civil – volume 1 (arts. 1º a 317) / Cassio Scarpinella Bueno (coordenador). São Paulo: Saraiva, 2017. p. 137.